07 Julho 2023
O El Niño já está aqui. E, como alertam os cientistas, vai se juntar ao aquecimento que o planeta acumula devido ao efeito estufa causado pelos humanos para, provavelmente, deixar recordes de calor “desconhecidos”. Mas, além disso, este fenômeno incide em eventos climáticos extremos que precisarão ser enfrentados, como chuvas torrenciais em alguns lugares, secas em outros e maior risco de incêndios florestais.
A reportagem é de Raúl Rejón, publicada por El Diario, 05-07-2023. A tradução é do Cepat.
O fenômeno El Niño é uma variação natural que afeta o clima global. Um fenômeno “que molda o clima severo globalmente e causa inúmeros impactos socioeconômicos”, como expõe uma recente pesquisa do Dartmouth College. De 1984 a 1997, o El Niño custou de quatro a cinco trilhões de euros. Com a amplificação que a mudança climática acrescenta ao El Niño, “projetamos perdas de 80 trilhões no século XXI”, explicavam os autores na Science.
Ao provocar o aquecimento de uma grande massa de água no Pacífico central e oriental, uma das consequências tangíveis do El Niño é o aumento das temperaturas na Terra. Acrescentará mais calor ao acumulado pelo planeta pela mudança climática. Esse foi o principal alarme lançado em maio, quando os dados coletados no Pacífico indicavam a aproximação desse fenômeno. Os próximos cinco anos serão o período mais quente, desde que há medições. Mas, não é a única coisa.
Esse fenômeno “está relacionado a uma intensificação das chuvas na América do Sul, no sul dos Estados Unidos, no Chifre da África e na Ásia Central”, afirma a Organização Meteorológica Mundial (OMM).
As chuvas torrenciais aumentam o risco de enchentes e inundações: um fenômeno bem conhecido na Espanha. No Peru, Equador e Bolívia, em parte da Argentina e Uruguai, além da Somália, apresentam um aumento de 25% a 50% nos danos esperados por inundações, durante os anos do El Niño, de acordo com uma revisão realizada por várias universidades europeias e norte-americanas [Strong influence of El Niño Southern Oscillation on flood risk around the world]. A mesma pesquisa atribuiu à Península Ibérica um aumento de 10% a 25%.
O professor de Física da Universidade de Barcelona, Javier Martín-Vide, recordou em várias ocasiões como o El Niño mais intenso do século XX, o de 1982-83, “coincidiu com as chuvas torrenciais na bacia do Júcar que deram origem ao pântano de Tous, em outubro de 1982”.
A oscilação do El Niño causa efeitos opostos, dependendo da região do planeta que se observa. Assim, inversamente ao aumento de chuva, o fenômeno “pode provocar secas severas na Austrália, Indonésia, sul da Ásia, América Central e norte da América do Sul”, especificam na OMM.
Com as secas associadas ao El Niño anterior, em 2016, mais de 40 milhões de pessoas precisaram de assistência alimentar apenas em países como Zimbábue, Moçambique, África do Sul, Zâmbia e Malawi, segundo a FAO. Daquela falta de chuva, 84% do impacto “foi absorvido pela agricultura”. Por exemplo, de 50 a 90% das colheitas de milho e feijão fracassaram no corredor centro-americano, segundo a agência da ONU.
Essas secas “afetaram o estado nutricional e a segurança alimentar e de água de cerca de 60 milhões”, aponta o balanço da FAO, que estima ter utilizado mais de 230 milhões de euros em projetos de recuperação e resposta.
A mesma organização estima que os eventos extremos de chuvas e secas derivadas do El Niño, de sete anos atrás, fizeram com que “100 milhões de pessoas na África, Ásia e América Latina enfrentassem escassez de alimentos e água”.
Também relacionado com as chuvas, o El Niño até agora deixou temporadas de furacões mais fortes no Pacífico e enfraqueceu os registrados no Atlântico. Contudo, a Agência Meteorológica dos Estados Unidos (NOAA) informou que a temporada de furacões no Atlântico de 2023 (que começou no dia 01 de junho) tem 40% de probabilidades de ser “normal”. Esperam de 12 a 17 tempestades tropicais, cuja relevância faz com que tenham nomes, dos quais de cinco a nove serão furacões.
Se o El Niño costuma atenuar os furacões no Atlântico, “esse efeito pode ser compensado pelas condições” que estão ocorrendo no mar: temperaturas da água mais altas do que o normal e uma monção africana mais ativa, detalha a NOAA.
O Painel Intergovernamental de Especialistas em Mudanças Climáticas – IPCC explicou que ainda não há muita certeza se a mudança climática provocada pelas emissões de gases dos humanos está alterando o ciclo do El Niño e La Niña. Existem modelos que apontam que se intensificará e outros estudos consideram que se dará o contrário. No entanto, o que esses cientistas observam com mais clareza é que os eventos extremos terão mais força. Funcionam como uma piora nos impactos da mudança climática.
“Os alertas precoces e a previsão de eventos extremos associados ao El Niño são vitais para salvar vidas e meios de subsistência”, considerou o ainda secretário-geral da OMM, Petteri Taalas. “Muito bem ressaltada” a importância dos alertas, disse, recentemente, a meteorologista argentina Celeste Saulo, que liderará a OMM a partir de 2024.
Em todo caso, o que está estabelecido é que o El Niño trará mais calor. Temperaturas mais altas que incidindo durante o verão boreal (próprio da Espanha) exacerbam o risco de incêndios florestais. A fórmula básica combina a secura do verão com o forte calor que afeta a vegetação e favorece a propagação das chamas.
No momento, 2023 está sendo um ano ruim para as florestas. No Canadá, por exemplo, 7,9 milhões de hectares já foram queimados. O que significa 1.597% a mais do que a média do decênio. Em escala espanhola, até 25 de junho, 58.800 hectares de florestas, quase o dobro da média dos últimos dez anos para esse momento. É o segundo pior registro da década, só superado, justamente, pelo anterior. A temporada de risco máximo começou no dia 01 de junho.
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Não é só o calor: El Niño traz chuvas torrenciais, secas e risco de incêndios - Instituto Humanitas Unisinos - IHU